Reflexão Pessoal ...

À partida para este mestrado a avaliação das aprendizagens era uma das temáticas que maior interesse me suscitava.
Esse interesse foi aumentando à medida que os temas iam evoluindo, acompanhados por leituras que, por sua vez, davam origem a mais interrogações e dúvidas.
As pesquisas, tanto nos livros como na web foram aumentando e a vontade de alargar os meus conhecimentos na área da avaliação pedagógica levaram-me a elegê-la como tema da minha dissertação.
Penso que nesta área ainda há muito para fazer nas nossas escolas.
Para passar das palavras aos actos vou realizar em princípios de Setembro, na Escola Secundária da Ramada, um workshop destinado aos membros do conselho pedagógico e aos supervisores de cada grupo de recrutamento, por sugestão daquele órgão de coordenação.
Este blog será reestruturado para servir de apoio ao workshop e, também por essa razão, todas as críticas serão bem-vindas.



Sendo a avaliação das aprendizagens dos alunos uma componente fundamental da educação escolar e dos processos escolares de ensino e aprendizagem, é inquestionável que os esforços no sentido de melhorar a educação exigem, necessariamente, a melhoria das práticas avaliativas.

Será de realçar o duplo valor regulador da avaliação:
ü  o papel formativo da regulação no ensino
ü  o papel formador da regulação na aprendizagem
mas, também, o processo da auto-avaliação da aprendizagem.
Vários autores têm realçado a importância do contexto em que se realizam quer os processos de ensino e de aprendizagem, quer os de avaliação. Gipps (1999) foi ainda mais longe ao considerar que a avaliação não pode jamais ser vista fora do seu contexto social, económico e político, uma vez que as respostas dos alunos são social e culturalmente condicionadas.
Mas nada melhor que um exemplo para contextualizar esta ideia. E se os responsáveis políticos, à semelhança do que acontece em alguns dos países mais desenvolvidos da Europa e um pouco na linha de reflexões desenvolvidas por Cardinet (1986),  determinassem que:
§  não seria possível reter (reprovar) alunos na educação básica;
§  não seriam atribuídas classificações quantitativas antes do 9º ano de escolaridade, sendo as mesmas substituídas por apreciações qualitativas;
§  a avaliação seria obrigatoriamente de natureza formativa.
Estas medidas seriam suficientes para desencadear fortíssimas reacções contraditórias, e algumas bastante apaixonadas, na sociedade portuguesa. Independentemente do seu papel (professores, investigadores, educadores, pais, alunos) os vários actores teriam diferentes argumentos, uns a favor, outros contra, para fundamentar o seu ponto de vista. Mas aqui a questão a reter seria a de saber se o sistema educativo e as pessoas que nele trabalham ou que dele se ocupam, aguentariam este tipo de medidas, mesmo que devidamente planeadas e com meios que as pudessem suportar.
Contudo, as medidas preconizadas estão integradas há já vários anos no sistema educativo finlandês, o mesmo que tem sido elogiado em Portugal por muitos políticos, mas também por muitos membros da sociedade civil, com maiores ou menores ligações ao sistema educativo. É um facto que a Finlândia se encontra na linha da frente do sucesso educativo mas não é menos verdade que não seria possível decalcar para o sistema educativo português as particularidades que conduziram as políticas educativas finlandesas ao sucesso.
Peguemos no exemplo da avaliação das escolas. Tem-se assistido a um conflito de ideologias sobre a questão da avaliação das escolas recorrendo muitas vezes apenas à comparação de taxas. No fundo, estas taxas apenas representam o produto final. Os processos que conduzem à obtenção dos números não é levado em linha de conta. Na Europa, a avaliação das escolas continua a revelar concepções e práticas completamente distintas nos diferentes Estados-Membro.
Na Inglaterra, onde a avaliação externa das escolas é feita por uma entidade externa, OFSTED, sem qualquer vínculo ao ministério da educação, tem-se dado um enorme realce aos resultados dessas avaliações, que são amplamente divulgadas, principalmente no momento dos pais escolherem livremente a escola para os seus filhos. As escolas com fracos resultados são sujeitas a programas rigorosos de acompanhamento e observação no sentido de ultrapassarem as suas dificuldades. Seria esta uma excelente bandeira da concepção neo-liberal da educação não fora os últimos resultados do Program for International Student Assessment (PISA), para 2009, que apresentam um retrocesso considerável em algumas das prestações dos alunos ingleses de 15 anos, na literacia na língua materna e na matemática. Outro aspecto curioso será a notícia divulgada pelo jornal Guardian online, do passado dia 14 de Julho, onde se pode ler que alguns directores escolares foram acusados de organizarem visitas de estudo com os alunos mais problemáticos nos dias aprazados para as visitas dos inspectores do Ofsted. E os professores com problemas mais graves na gestão da sala de aula eram aconselhados a ficar em casa, sendo substituídos pontualmente por professores mais experientes e competentes. Claro que já se anunciam alterações, nomeadamente que as escolas só vão saber que vão ser “visitadas” pelos avaliadores quando estes lhes baterem à porta.
Já a Finlândia tem desenvolvido uma concepção muito distinta, com um sistema educativo completamente descentralizado, com as escolas a depender directamente do poder local, o qual poderá recorrer à avaliação externa mas só em situações pontuais. Existe sim uma forte auto-regulação, com a escola a fazer uma auto-avaliação rigorosa que lhe permite identificar clara e rapidamente os aspectos menos fortes, a corrigir ou reformular. Escusado será dizer que a Finlândia se encontra desde 2000, início do Programa, no topo dos resultados do PISA.
Mas voltemos à questão que nos trouxe a este ponto - seria possível aplicar em Portugal as medidas aplicadas na Finlândia e que levaram aos excelentes resultados que realçam a nível mundial o sistema educativo finlandês? Não! Não seria possível de todo porque a concepção que ambos os povos têm da escola é, à partida, completamente diferente. Na verdade as concepções, as culturas, os saberes e os valores das pessoas têm aqui um papel muito importante e as resistências a medidas daquela natureza, por muito sustentadas e acertadas que fossem, seriam muito provavelmente incomportáveis.

Em torno da avaliação das aprendizagens dos alunos decorre muito do trabalho que se desenvolve na escola. A avaliação, mais propriamente o que resulta da avaliação formativa, deve estar na base das decisões relativas ao que, quando e como se ensina, e todos os ajustes que se devem introduzir para responder à diversidade de necessidades geradas na sala de aula. Mudar pontos de vista sobre a avaliação implica mudar radicalmente muitas das percepções que se tem sobre como ensinar para conseguir que os alunos aprendam. Pensar na avaliação como um dos eixos centrais do currículo, e não como actividade secundária, não é habitual, porém, é um dos caminhos que mais mudanças introduz na prática lectiva dos professores e no êxito das aprendizagens dos alunos.
Neste caminho difícil há algumas etapas que têm que ser tidas em conta pelo professor:
§  compreender a avaliação totalmente integrada no processo de aprendizagem e evitar confundi-la com momentos particulares em que se aplicam testes, provas, exames;
§  considerar que avaliar, antes de atribuir uma nota, é conhecer a estratégia utilizada pelo aluno na solução de uma tarefa e, dessa forma, identificar as causas de suas dificuldades
§  deixar de acreditar que as provas com perguntas de respostas fechadas são mais objectivas que as de respostas abertas
§  romper com a ideia de que as provas indicam os alunos que fracassam e os que têm êxito na aprendizagem. Em muitos casos, são os próprios procedimentos de avaliação os responsáveis pelo fracasso dos alunos
§  acreditar que os próprios alunos podem ser capazes de reconhecer os seus êxitos e as suas dificuldades e deixar de acreditar que a avaliação é somente da responsabilidade do professor
§  acreditar que todos os alunos, ou a maioria deles, são capazes de realizar aprendizagens significativas e mudar a ideia de que em todas as turmas existe sempre uma percentagem de alunos fortes, fracos e médios.

Bibliografia
GIPPS, Caroline & STOBART, Gordon (2003). Alternative assessment. In T. Kellaghan & D. Stufflebeam (Eds.), International Handbook of Educational Evaluation. Dordrecht: Kluwer, pp. 549-576.
Fernandes, D. (2009). Avaliação das aprendizagens em Portugal. Investigação e teoria da actividade. Sísifo. Revista de Ciências da Educação, 9, pp. 87-100. (Consultado em Maio de 2011 em http://sisifo.fpce.ul.pt).